Das rupturas com o tempo


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Vamos lá! Eu precisei escrever, pra consolidar alguns significados que essa imagem representa, dentre os tantos que – seguramente – ela ainda assumirá.

Nossa relação com o “tempo” adquire pesos distintos pra cada indivíduo, pra mim sempre foi conflituoso, ainda que eu saiba trabalhar bem com jogos de adaptações. Cada fase emoldura um conjunto de experiências, que costumeiramente chamamos de “ciclos”. Um ciclo é aquilo que se encerra em si mesmo e, consequentemente, habilita reinícios. Ao longo de nossas vidas o calendário é quase inevitável ao tentarmos elencar as ciclicidades que nos compõem e as fases que nos encerram. Isso é assustador! Somos indivíduos com demandas específicas acondicionados por um calendário comum. Da alfabetização ao ensino superior, da inserção no mercado de trabalho à aposentadoria. Somos, desde o nascimento, desrespeitados pelas convenções sociais de contagem do tempo! Aos 10 meses é preciso saber andar, aos 12, falar. Aos 6 anos, saber ler e escrever, aos 10, ser poliglota. Aos 18 estar na faculdade, aos 26 ter concluído o mestrado, aos 30 ser bem sucedido em todas as instâncias, ter casa, carro, cargo de chefia, um sem número de viagens internacionais, um casamento que pareça perfeito e, claro, um filho. Tudo que assegure um "status social". Enfim, construções que nos tornam performers de nós mesmos. Adotamos uma rotina – mais pela necessidade que pela escolha – na qual vivemos em função do relógio. E assim nos deixamos enraizar...

Nas ânsias e ansiedades, nossos pés correm mais rápido que o fôlego possa aguentar, e quando nos sobra fôlego, são os pés que estão cansados. A vida insiste em se apresentar desritimada e o tempo parece nunca ceder espaço às nossa fomes de mundo. Somos, o tempo todo, pela vida inteira, cobrados aceleradamente pela família, pela faculdade, pelo trabalho, pelo doentio sistema de produção no qual, arbitrariamente, estamos inseridos.  

Nos acomodamos com estes determinantes na vã ilusão de que se trata apenas de “uma questão de tempo” mas, né, o tempo passa e com ele as distâncias entre a disposição e a lassidão se estreitam. Acabamos imbuídos por aceitações que nada mais denotam que uma série de frustrações acometidas pela asfixia de uma vida acelerada e desencorajada. Por um sistema que nos pede pressa. Por um sistema que nos acovarda. Sem percebermos, robotizamo-nos. Vamos perdendo nossa empatia com o outro, nossa sensibilidade comunitária, nossa energia à luta de nossas próprias ideologias. E isso é tão cruel... desumanizamo-nos! 

Sabe, eu quis gravar tudo isso na pele! Sim, que é pra eu jamais esquecer. Pra ser a marca de uma autoavaliação e o selo de um compromisso. Pra que a mecanicidade da rotina me anule menos e engavete menos os meus projetos. Os meus projetos, os meus anseios, as minhas ideias com lugares, com cirandas, com teatro, com dança, com mato e argila, as minhas vontades de abraçar, de conhecer, de me apaixonar, e todas as palavras que me querem transbordar. É pra eu jamais me tornar todo o pessimismo que dá início ao meu texto. Eu quis gravar tudo isso na pele como a aliança que fiz comigo. Eu quero ter a minha identidade respeitada e não abraçar o que socialmente me exigem por convenção. Nego as frustrações das vidas medíocres, mesquinhas, dogmáticas.

Hoje, mais do que nunca, creio fortemente na minha capacidade de decisão e, felizmente, sigo em paz com o caminho que escolho todos os dias. Também creio no meu poder de renúncia, quando julgar necessário. O tempo que aprisiona é também o que liberta. E liberta porque é transformação, metamorfose. Tudo o que nos constrói é passível de ressignificações, o passado se reorganiza na memória e até nas intempéries há poesia. Eu quis uma imagem que abraçasse essa leitura. Uma leitura ainda – e sempre – em construção. Que é pra eu aprender a repousar minhas pressas, recolher a efemeridade da vida que se debruça nos ponteiros do relógio, e tutelá-la sob meu controle.

11/11/2014

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