Archive for agosto 2010

Analfabetismo, de Machado de Assis.


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"Gosto dos algarismos, porque não são de meias medidas nem de metáforas. Eles dizem as coisas pelo seu nome, às vezes um nome feio, mas não havendo outro, não o escolhem. São sinceros, francos, ingênuos. As letras fizeram-se para frases: o algarismo não tem frases, nem retórica.
Assim, por exemplo, um homem, o leitor ou eu, querendo falar do nosso país dirá:
Quando uma constituição livre pôs nas mãos de um povo o seu destino, força é que este povo caminhe para o futuro com as bandeiras do progresso desfraldadas. A soberania nacional reside nas Câmaras; as Câmaras são a representação nacional. A opinião pública deste país é o magistrado último, o supremo tribunal dos homens e das coisas. Peço à nação que decida entre mim e o Sr. Fidélis Teles de Meireles Queles; ela possui nas mãos o direito a todos superior a todos os direitos.
A isto responderá o algarismo com a maior simplicidade:
A nação não sabe ler. Há 30% dos indivíduos residentes neste país que podem ler; desses uns 9% não lêem letra de mão. 70% jazem em profunda ignorância. Não saber ler é ignorar o Sr. Meireles Queles: é não saber o que ele vale, o que ele pensa, o que ele quer; nem se realmente pode querer ou pensar. 70% dos cidadãos votam do mesmo modo que respiram: sem saber por que nem o quê. Votam como vão à festa da Penha, – por divertimento. A constituição é para eles uma coisa inteiramente desconhecida. Estão prontos para tudo: uma revolução ou um golpe de Estado.
Replico eu:
Mas, Sr. Algarismo, creio que as instituições …
As instituições existem, mas por e para 30% dos cidadãos. Proponho uma reforma no estilo político. Não se deve dizer: “consultar a nação, representantes da nação, os poderes da nação”; mas – “consultar os 30%, representantes dos 30%, poderes dos 30%”. A opinião pública é uma metáfora sem base: há só a opinião dos 30%. Um deputado que disser na Câmara: “Sr. Presidente, falo deste modo porque os 30% nos ouvem…” dirá uma coisa extremamente sensata.
E eu não sei que se possa dizer ao algarismo, se ele falar desse modo, porque nós não temos base segura para os nossos discursos, e ele tem o recenseamento."
/Machado de Assis

Em torno da Revolta da Chibata


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Em novembro de 2010 completa-se o centenário da Revolta da Chibata, uma das poucas revoltas de caráter popular que atingiu seus objetivos no Brasil e que deve ser lembrado de forma a resgatar os valores defendidos por marinheiros, liderados por João Cândido, que lutaram por justiça, exigindo dignidade.

Embora declarada a Lei Áurea, abolindo a escravidão no Brasil, tenha sido assinada em 1888, o uso do açoite permaneceu, observado de forma explícita na Marinha de Guerra, em sua maioria negros, “justificado” pelos superiores como medida disciplinar, castigando-os de maneira humilhante. As injustiças eram realizadas diante de todos, sem negociação.
Em alguns episódios da história do Brasil, percebe-se a imensa coragem das camadas inferiores, manifestada em forma de revoltas no momento em que sua indignação em relação ao sistema é tão grande que chega a ser incontrolável manter-se na posição de submissos. A finalidade de revoltosos, como os da Revolta de Chibata e tantas outras, é única: mostrar ao “mundo” sua existência na condição de gente!
O governo, na maioria das vezes, usou a força das armas para colocar fim às rebeldias populares. Não era poupada a violência exercida sobre os escravos ou qualquer classe social não detentora de poder, logo, a insatisfação abrangia grande parcela da população. A causa era o abuso de poder pelas altas classes, a conseqüência não escolhia vítimas: homens, mulheres, crianças, idosos. Mortos.
A importância de que se relembre fatos históricos como a Revolta da Chibata, de 1910, é essencial para a construção do pensamento humano das gerações futuras pois constituem verdadeiras fontes de estudo e posterior reflexão, alertando e aguçando o questionamento do homem em relação ao que se vive e, principalmente, a como se vive, adotando o respeito de forma geral, sem exclusões, moldando a sociedade calcada no respeito e na tolerância.



/Karina Morais
20/08/2010
*escrito no primeiro ano do ensino médio (2008), devia ter 15 ou 16 anos. Hoje, lendo, me parece tão inocente, mas já previa o interesse que a história me despertaria nessa louca fase de vestibular :)

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