Archive for 2016


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Afinidades ideológicas, um vinho pra margear as percepções, um vinil pra margear as vontades.

~ A respiração dele falava na mesma linguagem que a minha pele...~


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Sabe, eu tenho um blog. Eu nunca mostro, mas eu tenho um blog. Nele há meia dúzia de linhas em cada texto e meia dúzia de textos sem desfecho ou revisão. Tudo o que me proponho a escrever me é sempre tomado de assalto pelo sono. Nunca um rascunho deixou de ser rascunho e raramente releio o que escrevo. Evito esse tipo de encontro. Qualquer rabisco já nasce produto final e eu tenho me tornado perita em coisas inacabadas. Sobre o ontem, recordo mas não penso. Temo as doenças contemporâneas e não me permito morrer de nostalgia, reminiscências e amores. Sobre o amanhã, os pensamentos todos quase saltam pelo nariz. Pelo nariz, pela garganta, pelas cutículas, pelo diafragma... Faço logo uma planilha, cheia de cores e colunas, e abraço o mundo num Excel 2016. Pretendo viver mais uns 100 anos, preciso urgentemente me reconciliar com o tempo, me retratar com o sono e fazer do meu corpo um lugar habitável.

08/2016


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Cá pensando... propor-se ao exercício de autoconhecimento é como estar sempre às vésperas de nós mesmos. Ansiamos conhecer aquele que, no amanhã, já não se reconhecerá no momento agora. Todavia não me queixo, o hoje é sempre a véspera do sempre. Se pudéssemos, só um pouquinho mais, compreendermos as complexidades dos processos que nos encerram e nos recriam, aceitaríamos melhor a constância das inconstâncias.

05/04/2016

noite


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Um filme em praça pública, Sabotage. Um bar em um lugar comum. Companheirismo, feminismo, política. Mais do mesmo. Um pouco mais. Um brinde: bilhete com um nome e um número. Sorriso. Bilhete amassado para esquecer em um bolso qualquer. Cerveja. Caminhada. Cara, que lua linda. Caminhada. Casa. Cara, que lua! Décimo andar. Ops, errado. Escadas, chave. Chave? Porra... chave? Ufa, chave! Casa, meia luz. Um cigarro. Não, incenso. Agora um cigarro. Kumbayá. Cigarro entre os dedos de uma não fumante. Incensário. Um palo santo no incensário. Janela, aah... janela! E um CD de uma viagem recente. "No quería olvidar un detalle...". Música, janela, palo santo, kumbayá, lua. Vinho. Branco. Seco. Um vestido desabotoado pela metade. Lápis, caderno, meia luz e uma entrada do museu de Evita Peron. "Caminando por acá, tuve miedo...". Inspira... lua, janela, tosse. Rua: "curva perigosa, devagar". Janela, edifício, pontinhos de luz. Um prédio em contrução. Enooorme. Não estava alí quando saí. Prédio, construção, paisagem. O que havia antes dele? Paisagem. Um pedaço de céu que some. Expira... Janela, rua escura. Erma. Um menino que caminha. Um menino que caminha com um violão. Sorriso gratuito ao menino que não me vê. Última música, cinzas de um palo santo. Kumbayá, desenhos na fumaça, dedos que queimam. Cinzeiro. Vinho em uma taça errada. Um bilhete no lixo. Um bilhete, um nome e um número. Foda-se. Janela aberta. Aberta. Vinho. Nostalgia de um tempo recente. "Caminando por acá tuve tiempo de masticar los momentos". Casa. Casa que eu já não sei se é a minha. Janela. Ar. "El tiempo flota leve, como el peine te dibuja cuentos". Inspira... "Y solo brota el perfume de sintéticos frutales. Y los muros. Y miro el cielo... quiero partir."


31/03/2016

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