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Passado o período onde a efervescência política borbulhava no país, é preciso juntar os restos de fôlego que ficaram espalhados pela casa, na bagunça do quarto, na negligência com a alimentação, nos afazeres acumulados... de volta à percepção da rotina, que não cessa, mas por vezes se anestesia no sangue quente, que pulsa os anseios da militância. Pequenos prazeres como assistir um filme, ler um livro de literatura, correr no parque ou se permitir um domingo ocioso, assumem outra dimensão quando se precisa aprender a lidar com o tempo cronometrado. O fôlego vai se esvaindo a ponto de querer afogar em álcool todas as urgências que transbordam do peito. Todas as vontades particulares, os sonhos ideológicos, as meias ideias, os projetos engavetados, as palavras abafadas na garganta, as não adaptações. Um dia me explicaram a diferença entre solidão e solitude e, admirando a segunda, evitei vivê-la por medo de vê-la se transformando na primeira. Confesso que estar acompanhada comigo mesma, quando na ociosidade, me soa um tanto arriscado, a julgar que a introspecção é propícia às reflexões que vão pra além da racionalidade. Talvez eu tenha aprendido bem a lidar com as emoções que se vive coletivamente - e me apraz senti-las - mas ainda receio que permitir a livre manifestação das emoções individuais possam conduzir ao desequilíbrio. Não faço, com isso, uma defesa da negação do ser, mas um exercício de autoconhecimento. Percepção das construções a que nos emolduramos, enquanto mecanismos espontâneos de "autopreservação".  Com aspas, porque com essa mania de racionalidade, talvez um dia nem o eco responda mais.

Karina Morais
02.11.2014

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