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Um dos pés caminhava nú. Apenas um dos pés. Olhares de reprovação. Certamente menos estranhamento despertaria se ambos descalços estivessem. Unhas sujas, calcanhares rachados, compondo um pé enorme de cutículas inchadas. O pé que calçado seguia, também nem ele todo no chinelo cabia. Fingiu não reparar nos cochichos daquela gente de patas vestidas. "Proxima estação: Sé. Desembarque pelo lado esquerdo do trem". O menino saltou do vagão. Enquanto não tivesse seu par de pisantes completo, seguramente do chinelo velho de numeração pequena não se livraria. Ainda era possível, acreditava, um dos pés proteger. De sua fisionomia, nada recordo. Um menino sem rosto, marcado pelo estigma do pé descalço.

Karina Morais
28.02.2015

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