Acho que vou comprar água plástica...
Archive for setembro 2014
Sobre rotina, Mogi e pessoas
.
Cada vez que venho pra Mogi – cidade onde nasci e estive até os 18 – me
percebo confortada por uma sensação de alívio que ainda não sei bem explicar,
visto que voltar a residir aqui não está nas minhas pretensões. Lembro que,
quando morava em Mogi, procurava todos os pretextos pra sair, talvez o alívio
de hoje seja simplesmente por saber que, se por ventura (ou desventura) um dia
mudar de idéia, ainda será possível retornar.
Eu me moldei a um estilo de vida
intolerante à idéia de rotina, mas estreitamente enraizada nela. Sempre tive o
tempo cronometrado e uma avalanche de compromissos e responsabilidades desde
muito pequena, contudo, não reclamo, as escolhas sempre foram minhas e, se foi
e é assim, é porque eu conduzi minha vida dessa forma. Quando digo “intolerância à
rotina” é porque me convenci que eu só suportaria minhas próprias escolhas se
houvesse a possibilidade de fugir delas. Daí que acampo desde os 15 anos,
quando não posso acampar, corro pro mato mesmo assim. É minha válvula de escape
quando o “tempo fecha” e a rotina sufoca. O frustrante é perceber que essas
“rotas alternativas” dependeriam cada vez menos das minhas vontades e até elas estariam sujeitas às permissões de calendário e relógio. O que eu não tinha noção é
que, com 22, eu me depararia com condicionantes que aos 15 eu não me deparava.
Voltando ao papo de Mogi, sabe, é
estranho a relação que tenho [re]construído com essa cidade. O que sinto quando
retorno obviamente não é o mesmo que eu sentia a um ano atrás, menos ainda a
quatro. O olhar se ressignifica, sei disso, mas é curioso perceber essas
transformações na forma de se ver e entender as coisas. Tenho vindo com cada vez menos frequência, perdi o vínculo com a maior parte das pessoas que
conhecia aqui – e isso inclui bons amigos e relações afetivas – ainda tenho
reencontros legais, com gente que estimo, ainda frequento algumas festas
e bares de vez em quando, mas tenho atendido pouco as mensagens de “vamos
combinar algo?”. Longe de ser por não querer, ora preciso escolher entre
rever amigos ou estar com a família, ora entre estudar ou descansar. Confesso
que a procrastinação também tem sido uma constante, ainda que o coração peça o
contrário. Neste último caso, não sei ao certo a que justificativas recorrer –
se é que existem – mas tenho encontrado a resposta nos receios. Talvez me desestimule manter elos que já estão esvaziados, não por culpa minha ou deles, mas por conta do tempo. Talvez seja medo, por saber
(e aceitar) que a tendência pra essas e todas as pessoas que conhecemos ao
longo da vida seja mesmo o afastamento... e as relações se limitem a um “status
online” nas redes sociais. Pode soar pessimista, rancoroso ou qualquer coisa do
tipo, mas juro que digo com o coração calmo e a mente quase tranquila. Eu realmente já não
espero a perpetuação dos vínculos com absolutamente ninguém além de alguns poucos
familiares. Algumas pessoas serão sempre lembradas com carinho, é triste, mas o
distanciamento é inerente ao sistema em que estamos inseridos – e habituados - e eu não tenho nenhuma sugestão pra reverter isso.
Talvez a aceitação disso seja um erro. Mas tenho me habituado a trocar as reflexões pelo sono, quando o sono já me é inevitável.
Talvez a aceitação disso seja um erro. Mas tenho me habituado a trocar as reflexões pelo sono, quando o sono já me é inevitável.
Diante daqueles que gosto e que
compõem os meus círculos sociais no tempo presente, até me esforço pela
manutenção das relações, valorizo demais o simples prazer da companhia, porque
em todas elas enxergo pessoas ausentes num futuro não tão distante. O que faço,
e talvez elas também, seja tentar prolongar esse meio tempo em que podemos desfrutar
uns dos outros. Às vezes brinco, dizendo que eu me casaria com todos os meus amigos pra,
de repente, ter a “garantia” de que os laços perdurariam pra além dessa ou
daquela fase e que, companheiros de velhice, pudéssemos falar e rir de todas
elas.
Karina Morais
07/09/2014